sexta-feira, 24 de fevereiro de 2023

 Primeiro texto publicado no jornal Noticias de São Braz. Por mais tolo que possa parecer foi inspirado em um meme que minha prima Carolina postou em suas redes sociais (se eu reencontrar a imagem coloco aqui). Às vezes também gosto de desenhar as histórias então logo atualizo com os rabiscos dessa, não estão lá grande coisa mas até que gosto. No final das contas acabei eu mesmo refletindo muito sobre o tempo que gasto com algumas coisas.


FREDERICO E O TEMPO

 No fim da tarde de seu último dia de expediente, já de olho no relógio, como de costume, e com tudo pronto para partir e dessa vez nunca mais retornar, eis que Frederico viu um homem passar pela porta. Seria possível que, em seu derradeiro dia, alguém o faria permanecer por mais algum tempo naquela prisão?

 Frederico estava decidido: “Não tenho tempo para isso, vou despachar esse senhor e finalmente viver a vida que sonhei”. Infelizmente, sem perceber, o pensamento saiu em voz alta e o homem, que entrara pela porta, muito bem trajado com seu terno de risca de giz cinza, perguntou-lhe: “E que fará do tempo que lhe resta, senhor Frederico?”

 Envergonhado com sua indiscrição, Frederico percebeu que não valia a pena mentir: “Assistirei aos jogos do meu time de coração”, uma mentira deslavada já que nunca gostara de desporto algum, aliás, em sua vida não podia se recordar de ter praticado alguma atividade fisica. Chateado com essa percepção se perguntou: “Porque é que disse isso, devia ter escolhido algo que realmente gostasse de passar meu tempo fazendo...”

 O homem de terno sorriu e lançou uma nova pergunta: “Que gostaria de fazer então com o tempo que ainda tem?”

 Frederico refletiu e não podia pensar em nada que lhe apetecesse. Poderia assistir aos filmes que nunca viu, mas não gostava de ir ao cinema sozinho e achava a TV de sua sala pequena demais para a experiência. Talvez frequentasse os bares da região e assim reencontrar os amigos, porem não bebia há anos e de facto eram poucos os amigos que tinham tempo para estar em bares já que eram casados, com filhos e netos. Ele poderia passar mais tempo com sua família, se fosse casado... A música o incomodava, os animais não lhe agradavam, ler jornais parecia-lhe aborrecido, sua casa pequena não acomodava um jardim e cuidar de um era trabalhoso demais, preferiria descansar, se bem que passar o dia sem fazer nada era desagradável, vai ver foi por isso que nunca tirou férias.

 “Que diabos, pensou ele, que farei eu? Não sei...”

O homem de terno tocou a mão de Frederico, ele tinha um toque gélido como a morte: “Você vem comigo, sua hora chegou e agora tu não precisas mais te preocupar com nada”

 Frederico sentiu-se desconectar de seu corpo material, o homem era realmente a morte. 

 Partiu de rompante, sem dor nem sofrimento.

 O mais triste é que o homem só veio no final do expediente, Frederico tinha se dado ao trabalho de acordar cedo e passar por todo ritual que o levava ao escritório, ele podia ter vindo logo de manhã cedo.

 Ao menos agora teria tempo, pensou ele.

 

Publicado no Jornal Notícias São Bráz em Setembro de 2022

    Quando recebi o convite para escrever histórias aos jornais de onde vivo me surpreendi com o fato de que tinha tantas histórias na cabeça mas nenhuma delas parecia a certa. Às vezes complicamos demais as coisas, busquei inspiração em muitos lugares: livros, lendas, mitos, no folclore, não digo que elas não surjam lá ou cá em algum momento,  mas a vida cotidiana sempre foi mais interessante do que histórias pra lá de rebuscadas. Observar as pessoas, nesses tempos de hoje principalmente pelas redes sociais, espaço tão aberto e cheio de vivências e experiências onde elas gostam de postar e desnudar cada centímetro de suas almas, tornou-se o local perfeito, ao menos pra mim, pra esse qui pro quo maluco.

    Não sei bem aonde isso tudo vai me levar, na verdade nem penso muito nisso. escrevo porque preciso, se não as histórias e personagens ficam me atormentando na cabeça, querem sair, querem falar e por vezes não me deixam dormir. E é por isso que leio e quando posso faço meu artesanato, só assim a alma sossega.

    Sempre li muito, desde a infância, minha mãe incentivava esse hábito, ela era também uma leitora ávida. Acho que dos meus irmãos eu fui o que mais se apegou a essa prática. Já na fase adulta, numa das primeiras casas onde vivi cheguei a ter uma mini biblioteca com pouco mais de 300 livros e histórias em quadrinhos. Cansei de acumular coisas, lembranças, poeira, me desfiz de quase tudo, guardei aqueles que me eram  mais caros, o restante doei. Hoje tenho poucos e leio bem menos do que gostaria, o trabalho e as preocupações do dia a dia ocupam a maior parte do meu tempo mas sei que um dia retornarei aos livros ou eles a mim.

https://kdezaza.blogspot.com/2024/01/blog-post.html

  Primeiro texto publicado no jornal Noticias de São Braz. Por mais tolo que possa parecer foi inspirado em um meme que minha prima Carolina...